sábado, 2 de abril de 2011

Ao vencedor, as batatas!

Ao vencedor, as batatas!
Marcelo Moreira

Como explicar o sentimento de perda diante de uma não vitória? Há como?
Penso que a história muitas vezes nos mostra que sim. É grande a galeria de desportistas campeões que não nos saem da lembrança.
Mas existem exemplos claros que a competição sadia valoriza a todos que se propõe a participar, a brigar, a dar sangue, a dar amostras de seus talentos.
Não quero aqui ressaltar o jargão politicamente correto que diz “O importante é competir”. Não! O importante é fazer, é mostrar, é realizar e, partindo deste princípio, não existe um vencedor, existem vencedores.
Vencer é bom, gostoso, alimenta nosso ego, mas não se pode esquecer o caminho percorrido, a realização que é fazer, que é construir uma história por meio do que se pode sonhar.
Provavelmente pouca gente se lembra da vencedora da maratona feminina das olimpíadas de 1984 (http://www.youtube.com/watch?v=t2_Xu7AXAdY), duvido que alguém queira ver um velho vídeo da americana vencedora, no qual ela está ultrapassando a linha de chegada...
Mas existe uma imagem desta prova que está eternizada. A 37a colocada, a Suíça Gabriele Andersen de 39 anos que adentrou o estádio olímpico de Los Angeles toda torta e passando mal, caminhava com muita dificuldade, mas não tirava os olhos da linha de chegada.
Eu me lembro como se fosse hoje, eu tinha 13 anos, os olhos de minha mãe lacrimejavam ao ver aquela mulher sem forças caminhando como se estivesse bêbada.
Em um determinado momento, um médico correu pra ela, mas ela não permitiu aproximação. O médico então passou a andar do seu lado e, comovido, gritava palavras de incentivo.
Outros profissionais de saúde passaram a andar na beira da pista, sem se aproximar. Gabriele, sem forças, cruzou a linha de chegada e caiu, mas os três médicos não deixaram que o corpo daquela gigante tocasse o chão.
Naquele momento Gabriele entrou pra história. O mundo aplaudia e chorava de boca aberta pela 37a colocada. A primeira colocada, esta é apenas mais uma campeã.
Não quero aqui minimizar a conquista dos campeões, a eles os louros e o mérito de ter mostrado algo diferente que os colocou nesta condição.
O que quero aqui é exaltar aqueles que tinham na competição um motivo para desfilar seu talento, mostrar seu trabalho, tenho certeza que, neste caso, a mensagem terá sido transmitida.
Apurar os sentidos
Carpe Diem
Aquela poderia ser mais uma manhã, como outra qualquer. Eis que o sujeito desce na estação do metrô. Vestindo jeans, camiseta e boné, encosta-se próximo à entrada, tira o violino da caixa e começa a tocar com entusiasmo para a multidão que passa por ali, bem na hora do rush matinal. Mesmo assim, durante os 45 minutos que tocou, foi praticamente ignorado pelos passantes. Ninguém sabia, mas o músico era Joshua Bell, um dos maiores violinistas do mundo, executando peças musicais consagradas num instrumento raríssimo, um Stradivarius de 1713, estimado em mais de 3 milhões de dólares. Alguns dias antes Bell havia tocado no Simphony Hall de Boston, onde os melhores lugares custam a bagatela de 1000 dólares.” (O Verdadeiro Luxo, artigo de Márcia Bindo, publicado pela Revista Vida Simples, Edição 60, Dezembro de 2007).
Todos os dias quando subo a Serra da Mantiqueira, a caminho do trabalho, em Campos do Jordão, sou agraciado com a possibilidade de vislumbrar a exuberante paisagem natural que abraça a malha de asfalto que leva as pessoas àquela localidade. São inúmeras as espécies vegetais e animais que povoam aquela mata. Árvores, flores, arbustos, cachoeiras, raposas, esquilos, aves das mais variadas espécies e algumas outras surpresas podem ser vistas todos os dias por aqueles que por ali passam...
Depende apenas de apurarmos os sentidos... De olharmos com profundidade... De irmos além daquilo que é óbvio e evidente aos nossos sentidos... Temos que aprender a ler o mundo em suas entrelinhas...
E o que temos feito até o presente momento? Na maioria dos casos apenas perambulamos pelo mundo com nossos sentidos direcionados como se fôssemos cavalos puxando carroças, orientados pelo cabresto e mobilizados pela força do chicote que é batido em nossos lombos... Não aprendemos a diferenciar sabores... Raramente somos educados para apreciar a música em sua totalidade... Desprezamos a diversidade das cores e tons... Poucas pessoas são capazes de realmente discernir odores e fragrâncias... Estamos perdendo até mesmo a força do toque, do tato, do encontro físico...
Preferimos à virtualidade... Escolhemos a distância e a ausência... Vivemos nos desencontrando... Comemos aquilo que é pasteurizado, sem sabor, sem gosto... Nossas existências estão perdendo o calor, as emoções... Desconectados dos homens e da natureza, vivemos existências tristes e tentamos compensar consumindo...
Trocamos as sensações profundas de prazer e satisfação, que se constroem ao longo do tempo - com parcimônia, paciência e sabedoria – por experiências fugazes, velozes, inodoras, insípidas e incolores...
Hoje, nas escolas, se ensina eficiência. Mercado é a palavra-chave do ensino e da vida. Produção, consumo e lucro superam longe qualquer idéia relacionada à espiritualidade, valores e sentimentos...   
A curta narrativa que inicia essa reflexão, que nos conta a história de Joshua Bell e seu violino Stradivarius, tocando ininterruptamente por 45 minutos na entrada de uma estação de metrô é apenas um indicativo de como estamos ficando insensíveis... O que aconteceu com Bell está também ocorrendo com o planeta, devastado pelo aquecimento global... Situações semelhantes são aquelas em que pessoas morrem de fome por falta de solidariedade ou assistência... Tudo isso igualmente nos faz lembrar dos analfabetos, das vítimas das guerras, dos agredidos em virtude da intolerância, dos jovens que perdem a vida em função das drogas,...
Que mundo é esse que estamos construindo?
Aquarela
Toquinho
Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo
E com cinco ou seis retas é fácil fazer um castelo
Corro o lápis em torno da mão e me dou uma luva
E se faço chover, com dois riscos tenho um guarda-chuva

Se um pinguinho de tinta cai num pedacinho azul do papel
num instante imagino uma linda gaivota a voar no céu
Vai voando, contornando a imensa curva Norte e Sul

Vou com ela viajando Havaí, Pequim ou Istambul
Pinto um barco a vela branco navegando,
é tanto céu e mar num beijo azul

Entre as nuvens vem surgindo um lindo avião rosa e grená
Tudo em volta colorindo, com suas luzes a piscar
Basta imaginar e ele está partindo, sereno e lindo
e se a gente quiser ele vai pousar....
Numa folha qualquer eu desenho um navio de partida
com alguns bons amigos bebendo de bem com a vida
De uma América a outra consigo passar num segundo
Giro um simples compasso e num círculo eu faço o mundo

Um menino caminha e caminhando chega no muro
e ali logo em frente a esperar pela gente o futuro está
E o futuro é uma astronave que tentamos pilotar

Não tem tempo nem piedade nem tem hora de chegar
Sem pedir licença muda nossa vida,
depois convida a rir ou chorar

Nessa estrada não nos cabe conhecer ou ver o que virá
O fim dela ninguém sabe bem ao certo onde vai dar
Vamos todos numa linda passarela
de uma aquarela que um dia enfim
Descolorirá

Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo (que descolorirá)
e com cinco ou seis retas é fácil fazer um castelo (que descolorirá)
Giro um simples compasso e num círculo eu faço o mundo (e descolorirá)
Toquinho
(Cantor e Compositor Brasileiro)

Existe uma criança linda dentro de você. Provavelmente já lhe disseram isso e você, por teimosia, descrença ou absoluta falta de imaginação desprezou a afirmação. Então tente ficar inerte diante da composição Aquarela, de Toquinho; ou leia O Menino Maluquinho de Ziraldo e tente não sentir saudades de sua infância...
A criança nunca deixou de existir. Nem por um momento sequer. É que muitas vezes o adulto que a encerra deixou de sonhar. Parou de acreditar na Terra do Nunca, deixou de pensar que pode voar como seus mais amados super-heróis, não quis mais saber da Emília e do Visconde, esqueceu da bola ou da boneca,...
Agora só quer saber de correr. Parece o coelho da Alice e a todo o momento olha seu relógio. Está encarcerado numa rotina estressante que o faz cativo sem que nem ao menos se dê conta. Não sabe por que corre. Acha que se não fizer isso será atropelado, passado para trás, superado por outros, que nem ao menos conhece...
E o pior de tudo é que esse adulto, como os piratas do Peter Pan, não quer nem mesmo que as crianças sejam crianças por mais tempo. Faz força para acelerar o relógio biológico de nossas crianças para que não sejam mais infantis. Para que brincar? O negócio é namorar. Por que desenhar e pintar? É melhor ir para o Shopping. Subir em árvore ou ir ao parquinho? Que tal ir fazer umas compras...
As crianças não podem mais subir em árvores. Nem, tampouco, devem assistir desenhos animados. Acreditar em coelhinho da páscoa ou em Papai Noel então, é terminantemente proibido. Se seu filho usa roupas que tenham desenhos como o Mickey, a Mônica ou o Pernalonga depois de certa idade... provavelmente ele será alvo de chacotas e ridicularizações por seus pares na escola, no clube, na rua,...
E por que as crianças não querem mais fazer desenhos com o contorno das mãos ou navegar num barco com suas grandes e bonitas velas brancas estendidas como nos diz Toquinho em sua clássica composição? Será que os sonhos da infância não estão sendo massacrados por nossa ausência e indiferença? Quando foi a última vez que você se sentou para brincar com seus filhos?
Ouvi de uma pessoa religiosa que a catequese de nossas crianças é feita desde o seu nascimento e que os principais catequizadores são os próprios pais... Seu filho é fruto de seu envolvimento com a vida dele... Sua saúde física, mental e emocional está em suas mãos. Reserve a criança que há dentro de você para brincar com ele. Isso é o que realmente ficará para sempre...
Assim eu vejo a vida
Cora Coralina
A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver.
Sábias são as palavras que com simplicidade conseguem explicar o mundo em que vivemos. Sabedoria essa que está em extinção se nos atrevemos a estender os nossos olhares além dos próprios umbigos e prestamos atenção ao que dizem os demais. Há explicações em demasia e poucas delas conseguem ser simples e convincentes.
Se o tema dessas ponderações é a vida, mais difícil ainda se torna a nossa compreensão. O mundo nos parece nebuloso ao extremo quando tentamos ouvir as pessoas falando sobre a sua compreensão do que seria a vida.
O passado tem sido esquecido. O presente é o que importa. Nem mesmo o futuro parece de alguma forma nos levar a pensar com maior clareza a nossa existência. Se antes queríamos fazer do Brasil o país do futuro, hoje parecemos apenas nos importar com os assuntos imediatos, do momento que estamos vivendo.
Por mais que o passado tenha sido duro ou difícil, não podemos nos desvencilhar dele ou desprezá-lo. Suas lições têm que nos acompanhar hoje e sempre. Das lágrimas do que foi vivido sobrou a maturidade. Dos sorrisos que foram dados, permaneceu a esperança e a confiança em dias melhores.
É preciso saber viver e dignificar a condição humana. Aceitar que temos limitações e tentar superar as mesmas também compõe a nossa natureza. Acima de tudo temos que nos mostrar seguros e sólidos quanto as nossas crenças, a nossa filosofia e a ética que norteia nossas vidas, exatamente como a grande poetisa Cora Coralina...
Carta Aberta a Marx
Num mundo sem ideologias e bandeiras...
“Não é a consciência do homem que lhe determina o ser, mas, ao contrário, o seu ser social que lhe determina a consciência.”
“De nada valem as ideias sem homens que possam pô-las em prática.”
“Quanto menos comes, bebes, compras livros, vais ao teatro e ao café, pensas, amas, teorizas, cantas, sofres, praticas esporte, etc., mais economizas e mais cresce o teu capital. És menos, mas tens mais. Assim, todas as paixões e atividades são tragadas pela cobiça.”
Karl Marx
(Filósofo Alemão)
Amigo Karl,
Lembrei-me daquela sua frase de impacto que abre um de seus principais trabalhos, o "Manifesto". Você dizia que "um fantasma ronda a Europa". Certamente para tal período pensar em tais dimensões, ou seja, continentais, já parecia por demais de soberbo ou até mesmo exagerado na visão de tantas pessoas. Hoje temos que ir muito além do Velho Continente, do Novo ou mesmo do Novíssimo, pois que tal fantasma ronda todos os países do globo. Nesse aspecto vale rememorar um de seus principais discípulos, o Wladimir, aquele que liderou os russos em sua luta pela "ditadura do proletariado" e que depois teve que ceder espaço para um "déspota" nem um pouco esclarecido.
Lênin falava em "imperialismo como fase superior do capitalismo"... Talvez os termos estejam um tanto quanto em desuso, em virtude da desideologização dos embates e do próprio esvaziamento de qualquer disputa que hoje ocorra no planeta, exceto aquela que se processas à custa de fanatismos religiosos... Não mais cabe pensar em imperialismo talvez porque, apesar do Império do Tio Sam ainda existir e, da visível expansão do poderio e influência chinesa, por trás das bandeiras e nacionalidades estão os produtos, o comércio, as vendas, a lucratividade e a tal de "mais-valia" que você tão bem soube definir...
É Karl, o Materialismo triunfou, e não falamos aqui do Dialético ou tampouco do Histórico... O que prevaleceu foram os hábitos de consumo, o consumismo embalado pelos sonhos vendidos diariamente pelo marketing direto ou indireto, consciente ou inconsciente... Comprar é o verbo mais conjugado em todos os idiomas... No cartão de crédito, cheque ou dinheiro, tanto faz, o que importa é adquirir, dando em troca o suor do rosto, traduzido na forma de dinheiro, que de mero elemento de intercâmbio, tornou-se o maior dos pivôs de todas as grandes batalhas...
O Socialismo também virou produto. Tentaram exportar. Ninguém se preocupou em explicar ou ver se as pessoas queriam aceitar e assim viver... O comunismo, este já nem incomoda mais, nem os fascistas de plantão acreditam que tal fantasma, cadáver ou presunto (se é que algum dia chegou mesmo a tornar-se corpo - com músculos, sangue, carne e ossos) irá ressurgir tal qual o Jason, aquele de tantas Sextas-Feiras 13...
A verdade é que poucos entenderam ou se dispuseram a ir a fundo em suas brilhantes análises e teorias... Aqueles que conseguiram, quiseram empunhar as bandeiras de um mundo mais justo, equilibrado, harmônico, fraterno e de partilha... Tornaram-se mártires, enfeitam camisetas, boinas, bonés, pôsteres nas paredes, dão origem a filmes... Viraram produto, irônico, não é? De combatentes do Capital, transformaram-se em meios ou canais de obtenção de mais recursos, de mais fundos, de mais dinheiro... Viraram pó e, deste pó, tal qual a Fênix, transformaram-se em Capital...
Engels, seu parceiro de tantas obras e embates, creio eu, talvez tenha compreendido melhor como isto funciona, tendo em vista que durante suas vidas foi patrocinador de sua obra com dinheiro proveniente do capital das empresas familiares...
Mas não pense que o sonho acabou, só para lembrar outro cabeludo que por aqui passou... Suas lutas deram origem a direitos trabalhistas, a sindicatos, a revoluções (que infelizmente foram superadas pelo poder do capital e da ambição individual dos homens) e a uma centelha de sonho que ainda vive dentro de muitas pessoas, entre as quais, creio... Até em mim! E que sonho é este? Aquele de um mundo melhor, mesmo que para isto tenhamos que reinventar o capitalismo e as formas de opressão por ele geradas e por ti preconizadas...
Talvez o advento dos Verdes e de sua luta por um mundo menos poluído e devastado pela ambição consiga nos levar para uma realidade mais sustentável - tanto no que tange ao meio ambiente quanto no que se refere aos homens e seus pares...
É Karl, obrigado pelas lições, elas ainda estão por aqui, um tanto quanto inertes e insones neste momento, mas sobrevivem, seu legado enriqueceu a humanidade, mesmo que isto, aos seus olhos possa parecer um tanto quanto herético... O que vamos fazer dele ou com ele é a pergunta que permanece em tantas cabeças...
Pra você, um grande abraço!

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